25 de agosto de 2009 - UNIRIO - Sala 600 - 10h/14h dan marins, diogo liberano, jéssica baasch e natássia vello
. alongamento corporal junto ao trabalho vocal, conferir à voz outros lugares que não o costumeiro (a voz era usada para lembrar trechos do texto) - depois, sem usar as mãos, os dois atores tiveram que desmontar toda uma boneca russa (num esquema pas-de-deux, usando boca, cotovelo, pescoço, pés...);
. improvisação: "pelo poético, a violência dos versos, ritmos, a construção do drama que não precisa se explicar tanto, do drama que se constrói na reunião dos cacos" + dois objetivos individuais (ELE: "Disfarçar o fato de a ter matado" e ELA: "Progressivamente ir se descobrindo morta") + um dos objetivos deve vencer + a conclusão da improvisação deve prever a utilização do objeto (boneca russa). tempo para buscarem no texto alguns recursos e/ou ferramentas que os pudessem auxiliar na conquista de seu objetivo.
A improvisação foi interrompida aos 20 minutos. Surgiram falas um tanto informais, que quebravam a lógica poética de Pavlovsky e iam direto naquilo que queriam dizer. Por exemplo "Eu te perguntei primeiro". Surgiu, no início, um clima muito amigável entre os dois. Ele pergunta para Ela, "Você tá aqui, não tá?". Ela vai ficando inerte, quase sem dar resposta. "O som dos nossos corpos existe" (Som de tapa, som de beijo). Ela pergunta após isso, "Para quem?". Ela começa a exigir dele o verdadeiro do falso, somos ou fomos, simulação ou realidade. E diz: "As palavras fazem com que se esqueça tudo, por isso não falo".
. nova leitura do texto (32 minutos). Ele foi lido por NATÁSSIA. Ela foi lida por DAN. Viajamos para um território onde tudo pode ser invenção da cabeça dele, onde as coisas podem ter sido inventadas, onde ela existe sim, mas apenas dentro da cabeça dele.
. composição em duplas, 20 minutos para a preparação:
1 REVELAÇÃO 1 PITI 1 PROPOSTA DE ESPAÇO 1 REPETIÇÃO 1 DEMONSTRAÇÃO DE AFETO USO DE 1 CADEIRA (sem encosto)
. percepção de que as dinâmicas "estranhas" ao contexto original do texto (como o caso do "piti"), acabam conferindo uma força dramática muito grande, pois deslocam o local de ação, potencializam o drama, o revelam por outros meios, outras formas. .
21 de agosto de 2009 - UNIRIO - Sala 200 - 10h/14h dan marins, diogo liberano, jéssica baasch e natássia vello
. encontro como convite à obsessão: exposição do diário (rotina de pesquisas...), referências (cinema, teatro, literatura...) e idéias (vislumbres de encenação...);
. leitura da peça - foco: roubar o texto um do outro, mas mantendo a leitura constante, sem silêncio - sobreposição de falas, algo de coro e corifeu, respiração que se esgota e pede para ter a fala roubada, palavras no meio da frase abandonadas, história compartilhada nada parece ser exclusivo de um ser só, são os dois donos daquele destino - duração: 19 minutos;
. leitura pelo espaço - foco: soltos no espaço, os atores deveriam administrar as lógicas envolvendo espaço e tempo (ocupação espacial, relação de proximidade e afastamento dos corpos, ritmo, duração, pausas, repetição...) - outra dinâmica proposta: a leitura do texto deveria ser feita inversamente, ou seja, a última fala seria a primeira, a penúltima a segunda e por aí seguimos, até chegar ao final da leitura (com o término da primeira fala do texto original);
DURANTE ESTA SEGUNDA LEITURA surgiram lógicas interessantes de aproximação e afastamento entre os atores, principalmente. Esboçaram-se com mais força alguns estados apenas sugeridos pelo texto. Os atores usaram duas cadeiras, uma das quais de súbito cedeu ao peso dos dois e se espatifou inteira. Nesse momento, o Dan falou "A CADEIRA IA QUEBRAR UM DIA". Essa primeira abordagem tridimensional do texto trouxe de imediato uma relação de violência, quase uma briga mais sinistra de casal.
. trabalho com composições - foi pedido aos atores que fizessem individualmente cada um uma composição. as dinâmicas que deveriam ser obrigatórias foram:
- usar um trecho de algum dos livros; - proposição concreta de uma lógica espacial; - um embate entre alguma dualidade; - do embate, uma nova possibilidade; - ser obsessivo em algum momento.
A composição dos dois atores foi muito distinta. NATÁSSIA apostou num trabalho mais subjetivo. Sua proposta partia de um arena invertida, dentro da qual ela estava presa, tentando sair mas sendo lançada para dentro. Alguns gestos foram extraídos do livro de imagens do espetáculo italiano "HEY GIRL!", bem como algumas frases que foram traduzidas, como "o que tem dentro de um nome?". Uma nova possibilidade gerada pelo embate (dentro/fora) foi a presença no limite entre estar dentro ou fora. Com isso, uma proximidade corporal da atriz ao público sugere como alternativa ao dual, a existência no limite. Ou seria o "entre"? Também me sugeriu que a sobrevida (pensando-se esta como alternativa ao embate dual entre vida e morte) é o espaço do público. É estar entre a cena e o bastidor. Já a composição de DAN colocou duas cadeiras encostadas numa parede. O ator se fez passar por um interrogador e duas pessoas (DIOGO e JÉSSICA) permaneceram sentadas. Demorei para perceber que ele se tratava de um interrogador. DAN estava especialmente amigável em sua fala para nós, sugeriu uma conversa de amigos e só depois (com o acréscimo de algumas manifestações de violência) esta veio a sugerir e assegurar a existência de um violento interrogador. A obsessão era visível.
. o ensaio, acredito, funcionou como um convite à obsessão. atingimos novos territórios em relação ao texto (seria tudo uma invenção dele?) e passamos por todos os que já passaram por MIM e pela JÉSSICA desde o início deste processo. .
12 de agosto de 2009 - escola de comunicação/UFRJ - sala 120 - 15h/18h dan marins, diogo liberano, jéssica baasch e natássia vello
. encontro para buscar menos verdades e mais especulações sobre o texto
. uma primeira leitura da peça pautada na noção de "horror e afeto num mesmo gesto"
(duração: 29 minutos)
. jogo com cartas
DIOGO pede a NATÁSSIA um verbete: ela seleciona DESACONCHEGAR (v. t. Tirar o conchego a; incomodar).
NATÁSSIA pede a JÉSSICA um verbete: ela seleciona APEGO (s. m. Sentimento de afeição; agarramento; insistência; inclinação afetuosa; amizade).
JÉSSICA pede a DAN que comprove no texto a afirmação de que "ela cometeu suicídio"- ele cita dois trechos
"ELA Somos, fomos, você e eu, nossas histórias, nossas certezas.
Nossa maneira de sentir as coisas, disso não podemos nos arrepender
Cá você, lá eu,
é a distância que nos ajuda a nos reconhecer
que mistério é o que se cruza entre nós dois
fazendo-nos esquecer tanto passado quem sabe se somos tão diferentes
o que terá crescido tanto entre nós dois?
alguma coisa que não entendo, alguma coisa mais além que me faz
sentir ambígua e que me produz terror ter sentido piedade em algum momento
Como foi que surgiu, apesar de mim, isto da piedade entre os dois como piedade converter-me em piedosa eu que nunca o fui" (P.5)
"ELA Pensei que você me conhecia. Esse foi seu grande erro. Você pensava que tinha chegado a me conhecer e agora sofre porque não sabe com quem esteve tanto tempo, tantas horas e aí é onde seu pequeno tormento te fala de tantas horas equivocadas
Tanto trabalho malfeito, algo que não estava previsto
você pensava que a intensidade faria desvendar até o mais intimo do que mais se preserva na intensidade, sempre alguma coisa fica protegida
o indivisível no momento da gritaria e dali essa intimidade se agiganta porque o íntimo se converte no último baluarte para se preservar.
Ali se joga a SOBREVIVÊNCIA" (P.12)
DAN pede que DIOGO responda como que o texto permite essa situação de saída da personagem feminina se eles estão imersos numa relação de tortura - ele volta a um trecho da página 4,
Ela tenta ir embora.
ELE Aonde você vai?
ELA (se detém) O tom de certas palavras sempre remete à imagens...
acha que não há possibilidade de fuga, mas que pelo movimento ela é capaz de causar nele alguma coisa. ela possibilita a redescoberta do que eles já viveram. ela testando nos mesmos movimentos, nas ações já feitas, alguma possibilidade de reaver o que passou. quando ameaça ir ela detona nele a pergunta "aonde você vai?". com a pergunta, ela consegue extrapolar e atingir outras imagens. é com a tentativa de fuga dela (porque não há uma possibilidade real de fuga) que eles dão continuidade ao jogo.
DIOGO pede a NATÁSSIA que comprove no texto a afirmação de que "ele a matou" - ela cita um pedaço final de uma fala da personagem feminina, da página 13 para a 14,
...Por isso hoje só você e eu enfrentamos o vazio da perda do sentido, e isso é insuportável. Na minha memória só ficou disso tudo a lembrança dos movimentos.
NATÁSSIA pede que DAN responda porque o texto começa numa narrativa de movimento - ele desenvolve que o personagem masculino está esperando ela terminar de morrer para tentar estabelecer algum diálogo possível, por isso tantas vezes ele fala "Como continuo? Quanto falta?"
DAN pede a JÉSSICA que comprove no texto a afirmação de que "ela tem o domínio durante todo o momento" - ela cita
ELE Por que sempre as evasões ganhando em teu Silêncio?
E queria que você gritasse todas as verdades
que me olhasse mais em teu Silêncio...
Se você pudesse me insultar, quebrar a calma, perder o controle um momento, apenas...
se você pudesse falar de nossa história, de toda nossa história... da verdade da nossa história compartilhada.
Você não falou antes e não quer dizer meu nome agora
quem sou eu então?
e desenvolve que é pelo silêncio que ela se faz mais forte do que ele. até mesmo se acreditarmos que ela está morta, o silêncio condiz ainda mais. a necessidade de reconhecimento, de comprovação, de nomeação é tudo o que ele precisa para se firmar, mas ela nega justamente isso. ela silencia. ela recusa a ele justamente aquilo que faria dele o ser mais forte.
JÉSSICA pede que NATÁSSIA responda como ela entende o jogo da página 9, a seguir:
ELE Quem
ELA Ela
ELE Ela quem
ELA Quem ela
ELE Quem ela quem
ELA Ela quem quem
ELE Eu falo sério
ELA Quem quem ela
ELE Quem
ELA Ele
ELE Ele quem?
ELA Quem ele
ELE Quem ele quem
ELA Ele quem quem
ELE Eu falo sério
ELA Quem quem ele
ELE Quando
ELA No destempo
ELE Onde.
ELA Juan Arriveños, 341
ELE Quem
ELA Almoçando com o que sorri à direita
ELE À direita de quem
ELA Mais para trás Peter
ELE Como?
ELA Loiro com alguns cabelos brancos, é difícil distinguir os brancos dos loiros
ELE Quem
ELA Peter e Juan
ELE Onde?
ELA Se conheceram num churrasco de uma menina de sobrenome Ocampo
ELE Quem como?
ELA Boa gente, um tanto tímida, que se formou no Colégio Northlands de Olivos, de onde surgiu Lea Fate, jogadora de hóquei do Sury
ELE Lea quê?
ELA O irmão Paul Fate jogava rúgbi em Quilmes. A relação entre Ocampo Peter e Juan não deixa de ser um mistério.
ELE Aqui há mistérios
ELA Ocampo tinha relação com Peter e Juan. Juan tinha relações com Ocampo. Peter tinha relação só com Juan. Portanto Ocampo levava vantagem de conhecer os corpos de Peter e de Juan. Juan conhecia o de Ocampo
ELE Mais devagar
ELA Peter conhecia o de Juan e o de Ocampo. Juan se apaixonou por Peter e Peter por Ocampo. Logo depois de separaram porque os três sofreram muito
ELE Não acredito. Quem?
ELA Ela
ELE Ela quem
ELA Quem ela
ELE Quem ela quem
ELA Ela quem quem
ELE Eu falo sério
ELA Quem quem ela
ELE Quem
ELA Ele quem?
ELE Quem ele
ELA Quem ele quem
ELE Quem quem
Eu falo sério
ELA (gritando) Quem quem ele
ELE De onde era?
ELA Quem
ELE Peter
ELA Da Irlanda do Norte
ELE Não acredito
comecemos outra vez
ela acha que a personagem feminina está sacaneando ele neste momento. ela responde com perguntas, suas afirmações são interrogações. e quanto mais insistente ele é, mais o jogo dela vai mudando, como se procurasse um lugar para chegar que sequer fora previsto antes. ela está especulando possibilidades e ele sequer percebe que tudo é inventado, que tudo pode ser apenas uma invenção. ela dá inúmeras voltas, cita diversas pessoas, cita detalhes, parentescos, situações, para não dizer nada no final das contas. ele não acredita no que ela diz. e talvez, nem mesmo ela acredite no que diz.
. uma segunda leitura da peça pautada na "noção de sobrevivência, de sobrevida"
(duração: 31 minutos)
. palestras
DIOGO dá uma palestra sobre vida e morte na obra de eduardo pavlovsky - fala da maca (que invertida vira cama) em posições inverossímeis. chama atenção para o fato de a peça dar conta do amor e da morte em uma relação. e para o fato de tudo já ter acontecido, possibilitando assim, mexer com o tempo e intercalar situações, ganhando assim novas possibilidades de relação. tanto a vida como a morte parecem um pouco mais além do que suas habituais noções. é possível estar vivo, mas morto. e possível estar morto, mas vivo. a peça subverte com a lógica vigente, abre pela violência de sua poesia, novas configurações, novas relações possíveis...
JÉSSICA dá uma palestra sobre os preconceitos na peça de eduardo pavlovsky e identifica três mais marcantes: 1) uma visão preconceituosa no que diz respeito às imagens do homem e da mulher, principalmente se levarmos em conta como choca ao personagem masculino a possibilidade de se relacionar com uma mulher mais forte do que ele, sugerindo que todas as outras relações tivessem sido pautadas num domínio do homem; 2) apresentação da mulher como um objeto físico, um objeto de desejo, sexual; e 3) relação da masculinidade pela ótica da violência, como se para ser homem fosse preciso saber bater, como se a existência para ser, precisasse passar pelo domínio físico, que eliminaria qualquer possibilidade de covardia.
NATÁSSIA dá uma palestra sobre a história da peça e afirma que a peça começa segundos após ele a ter matado. ela afirma que toda a relação do personagem masculino com a mulher foi criada, por ele. ele interrogou-a, criou uma obsessão, por isso ela é evasiva, porque a relação não existe na realidade. ele revive o que gostaria de ter sido, ele pede a ela que confirme aquela relação, mas ela não o faz, justamente porque não existiu nada daquilo. o esforço dele é conseguir qualquer nome, qualquer coisa, qualquer reconhecimento.
DAN dá uma palestra sobre o que movem as personagens. e afirma que não acha que os personagens se movem muito. percebe que ele se move mais do que ela, apesar de indicar que ela talvez mova coisas que acabam por movê-lo. identifica ela como detentora de um domínio, enquanto ele está imerso numa situação de desespero. ele se move pelo desespero. ele quer provar uma importância histórica de sua figura (homem). .